A aspirina é não só o fannaco me1hor estudado em todo o mundo, como o mais frequentemente uti1izado em todos os tempos. Alem das suas propriedades como analgesico e antipiretico, o acido acetilsalicflico (AAS) e urn inibidor da agregação plaquetária, o que the confere urn papel essencial na profilaxia do tromboembolismo e na prevenção dos acidentes cardio e cerebro-vasculares.
A associação da sensibilidade á aspirina, com a asma e a polipose nasal, descrita pela primeira vez por Femand Widal e colaboradores, constitui a trfade da “Asma lnduzida pela Aspirina” (AlA) e refere-se ao desenvolvimento de urn quadro de broncoconstrição em indivfduos asmaticos após ingestao de aspirina. Nestes doentes, os sintomas agudos sobrepõem-se ao quadro clfnico de asma crónica grave. As crises de asma podem ser desencadeadas por pequenas quantidades de AAS ou de outros anti-inflamatórios nao ester6ides (AINE’ s).
A prevalência da AIA na comunidade é incerta, mas os doentes com AIA constituem 10 a 20% da popula9ao asmatica, sendo a AIA mais frequente nas mulheres. Os autores deste trabalho fazem uma revisão teórica da AIA, descrevendo a apresentação clfnica, os mecanismos patogenicos, o diagnóstico e o tratamento deste síndrome.
A asma e uma doença inflamatória crónica das vias aéreas. Neste estado de inflamação continua, a exposiyao aaspirina provoca no subgrupo de doentes com AIA uma acentuayao temporaria do processo inflamat6rio, que conduz á exacerbayao da asma. Embora assemelhando-se as reacçães de hipersensibilidade imediata, a AIA nao parece ser mediada por mecanismos dependentes da IgE, daí estas reacçães scrcm dcsignadas de “anafilactóides”.
A hipersensibilidade à aspirina parece antes ser mediada por um desvio da via metab6lica do acido araquidónico no sentido da produção excessiva de leucotrienos, por sua vez responsáveis pelas alteraçães inflamatórias da AIA. Os leucotrienos derivam do ácido araquidónico através da via da 5- lipoxigenase (Fig.l). A enzima LTC4 sintetase, que converte o leucotrieno A4 nos leucotrienos C4, 0 4 e E4, apresenta uma elevada expressão genética nos doentes com AIA., quando comparados com asmáticos que toleram a aspirina (ATA). Esta maior expressão da LTCJ sintetase na parede bronquica dos doentes com AIA, parece ser o factor determinante mais importante das reacções respiratórias agudas à aspirina.
Por outro lado, a aspirina e os outros AINE’s com propriedades inibidoras da ciclooxigenase- enzima que cataliza a formação de prostaglandinas a partir do ácido araquidónico - derivam o metabolismo deste para a fonnação de mais lcucotrienos (Fig.1) através da via da lipoxigenase, propiciando assim o aparecimento das alterações inflamat6rias que ocorrem na AIA.
A inibição da enzima ciclooxigenase conduz ainda aremção de uma prostaglandina com efeitos broncodilatadores, a PGE2, que funciona habitualmente como “travao” do processo inflamatório. Mantem-se contudo a sfntese de prostaglandinas pr6-inflamat6rias - PGD2, PGF2α e PGF2 - outro factor potencialmente detenninante na patogenese da AIA.
Os sintomas da AIA surgem habitualmente após os dez anos de idade e são mais frequentes na terceira década de vida. Nas primeiras três horas após a ingestao de aspirina ou de urn AINE, surge uma exacerbaçãao aguda de asma, acompanhada de rinorreia profusa. hipcrcmia conjumival, edema periorbitário e por vezes, urn “flash” da face e do pescoço. Em 50% dos doentes com AIA, a asma é crónica, grave e dcpendente de esteróides. A broncoconstrição pode ser potencialmente fatal, requerendo internamento hospitalar e por vezes, ventilação mecanica.
O diagnóstico é obtido pela história clfnica. Na maior parte dos doentes com AIA, a asma e persistente moderada a grave. Nos casos duvidosos, deve realizar-se a prova de provocação oral com aspirina ou com AINE, que deve ser realizada em mcio hospitalar, pelos riscos que envolve. A prova de provocação nasal com acetilsalicilato de lisina tern igualmente demonstrado ser urn teste seguro, simples e especffico no diagnóstico da AIA.
A Iongo prazo, os doentes dcvem cvitar a aspirina e produtos que a contcnham, bem como os AINE's com reacção cruzada à aspirina (ex.: piroxicam, indometacina, diclofenac, naproxeno, ibuprofeno…). Se absolutamente necessários, devem ser preferidos AINE’s com fraca inibição da ciclooxigenase 2 (isofonna desta enzima que e indutfvel durante a inflamação e potencia a sfntese de prostanóides inflamatórios) e da ciclooxigenase 1 (isoforrna constitutiva das células no seu estado basal) de que e exemplo o acetaminofeno, ou AINE's com inibição rclativa da COX-2, como o nimesulide eo meloxican. Estes fárrnacos só induzem AIA, quando administrados em altas doses ou em doentes com elevada sensibilidade.
Quando a terapêutica com AAS ou com AINE’s e essencial ao doente, como acontece nas doenças reumato16gicas ou na profilaxia do enfarte do miocárdia, deve proceder-se á terapêutica de dessensibilização induzindo a tolerancia a estes farrnacos, atraves da ingestão de doses crescentes de aspirina durante 2 a 3 dias, ate atingir 400mg a 650mg por dia. A dose de manutenr;ao e habitualmente 100 a 300mg por dia e deve ser mantida regularmente, caso contrario veritica-se regressao ao nfvel anterior de sensibilidade a este farmaco.
As regras gerais de tratamento das exacerbarçães agudas da AIA não di ferem das normas publicadas para o tratamento da asma. Os anti-lcucotrienos (zatirlucast, montelucast, pranlucast e zilcuton) são farmacos que atenuam as reacrções br¿nquicas induzidas pela aspirina é induzcm broncodilatarção nos doentes com AIA, constituindo aparentemente uma terapêutica muito eficaz da asma induzida pela aspirina.
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