Neste artigo os autores fazem uma revisão sobre a definição e a avaliação de dois conceitos: a limitação dos débitos expiratórios e a hiperinsuflação dinâmica, dando particular relevo aos aspectos que consideram importantes na doença pulmonar.
A presença de limitação dos débitos expiratórios durante a respiração em volume corrente promove a hiperinsuflação pulmonar dinâmica e a pressão positiva no final da expiração intrínseca (PEEPi), levando a um aumento do trabalho respiratório, ao défice na função dos músculos inspiratórios e a efeitos hemodinâmicos adversos. Estas alterações, em conjunto com a compressão dinâmica das vias aéreas durante a respiração em volume corrente, podem contribuir para a ocorrência de dispneia.
De acordo com uma hipótese proposta recentemente por Milic-Emili J1, a transição entre a doença das vias aéreas periféricas e a DPOC em fumadores é caracterizada por três fases sequenciais, nas quais a limitação dos débitos aéreos tem um papel central.
Na primeira fase, o volume de encerramento excede eventualmente a capacidade residual funcional. Na segunda fase, surge a limitação dos débitos expiratórios. Na terceira fase, a hiperinsuflação dinâmica acentua-se progressivamente, levando à dispneia e à intolerância ao exercício. O encerramento das vias aéreas e a limitação dos débitos expiratórios que ocorrem na respiração em volume corrente podem promover lesão das vias aéreas periféricas e acelerar o agravamento das alterações da função respiratória.
Por definição, a limitação dos débitos aéreos requer a demonstração de um aumento da pressão transpulmonar sem aumento concomitante do débito expiratório, ou seja, requer a determinação, para os mesmos volumes, das relações entre o débito e a pressão transpulmonar. Contudo, este método é tecnicamente complexo, consumidor de tempo e invasivo, pois requer a introdução de um balão no esófago.
O método convencional usado até há pouco tempo foi proposto por Hyatt em 19612 e consiste na sobreposição da curva débito-volume obtida em volume corrente com uma curva débito-volume máxima. De acordo com esta técnica, nos indivíduos normais, a curva obtida em volume corrente nunca atingia a curva máxima, mesmo quando era realizado um exercício máximo. Pelo contrário, a limitação dos débitos expiratórios verificava-se sempre que a curva medida em volume corrente se sobrepunha ou mesmo ultrapassava a curva máxima. Este método é passível de limitações metodológicas: Artefactos devidos à compressão do gás intratorácico; o alinhamento incorrecto das curvas obtidas em volume corrente com as curvas máximas; o efeito das variáveis volume e tempo prévias a ambas as medições é diferente; a mecânica ventilatória e as desigualdades da constante tempo também são diferentes durante os esforços expiratórios máximos e em volume corrente; o exercício pode resultar em broncodilatação ou em broncoconstrição; a cooperação do doente. Segundo estes autores, dadas as limitações do método convencional, este não deve ser recomendado.
A técnica da pressão expiratória negativa (NEP) É um método que ultrapassa as limitações dos métodos tradicionais de avaliação da limitação do débito expiratório. Não requer manobras de capacidade vital forçada, colaboração por parte do doente ou recurso à pletismografia e pode ser medido com o doente em respiração espontânea em qualquer posição corporal, durante o exercício e em contexto de cuidados intensivos. A técnica consiste na aplicação de uma pressão negativa (-3 a -5 cmH2 0) durante a expiração. O método NEP baseia-se no princípio de que, na ausência de limitação de débito expiratório, o aumento do gradiente de pressão entre o alvéolo e as vias aéreas superiores causado pela NEP irá provocar um aumento do débito expiratório. Pelo contrário, em indivíduos com limitação dos débitos, a aplicação da NEP não irá alterar o débito expiratório. Estes autores consideram que o FEV1 não é um factor preditivo específico de limitação dos débitos expiratórios nos doentes com DPOC, sendo a limitação dos débitos expiratórios avaliada pela NEP um factor com maior valor preditivo da dispneia crónica do que o FEV1, nestes doentes.
Em contraste com os doentes com DPOC, a maior parte dos doentes com asma não tem evidência de limitação dos débitos expiratórios durante a respiração de repouso. Esta discrepância pode reflectir uma menor retracção elástica presente na DPOC.
Na avaliação da broncodilatação, Tantucci e colaboradores3 foram os primeiros a estudar o efeito de um broncodilatador (salbutamol) na capacidade inspiratória (IC) avaliada em repouso. Um grupo de doentes com DPOC com um valor semelhante de FEV1 (%previsto) foi subdividido de acordo com a presença ou não de limitação dos débitos expiratórios. A administração de salbutamol induziu um aumento significativo da capacidade inspiratória (acima de 10%) apenas no subgrupo de doentes que evidenciava limitação dos débitos expiratórios (cerca de 75% destes doentes).
Também foi demonstrado que o aumento da capacidade inspiratória após broncodilatação (com anticolinérgico ou com agonista β-adrenérgico) reflecte melhor a melhoria referida na tolerância ao exercício (escala de Borg)4. Esta melhoria foi objectivada em doentes com limitação dos débitos expiratórios em repouso, independentemente do valor do FEV1.
Quando o método NEP foi aplicado ao exercício, estes autores verificaram que a presença de limitação dos débitos expiratórios em repouso implicava o aparecimento de hiperinsuflação dinâmica com a hiperventilação do esforço. Segundo estes autores, em presença da limitação dos débitos expiratórios, a hiperinsuflação dinâmica parece ser o principal determinante do desempenho no exercício e a magnitude da capacidade inspiratória em repouso, sendo um marcador bem reconhecido de hiperinsuflação dinâmica, parece ser o melhor preditor clínico para esse desempenho.
O método NEP tem sido aplicado em vários contextos clínicos:
- 1)
DPOC (durante a ventilação mecânica; durante o exercício físico; correlação com a dispneia e com a ortopneia e com outros índices de função respiratória; antes e após a broncodilatação; em diversas posições corporais)
- 2)
Asma (asma estável; durante a broncoconstrição com metacolina; durante o exercício)
- 3)
Fibrose quística e bronquiectasias
- 4)
Doença pulmonar restritiva
- 5)
Obesidade
- 6)
Ventilação mecânica em contexto de insuficiência respiratória aguda e ARDS
- 7)
Insuficiência cardíaca esquerda
- 8)
Após transplante pulmonar
- 9)
Bócio eutiroideu
- 10)
Avaliação da hiperreactividade brônquica
O uso da técnica NEP com análise da curva débito-volume em volume corrente tem evidenciado a importância da limitação dos débitos expiratórios na dispneia de esforço e na limitação ventilatória num grande número de condições clínicas.
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