Durante os últimos anos, muitos esforços de muitos de nós se conjugaram na sensibilização das autoridades de saúde sobre a necessidade de se abordarem as doenças respiratórias de forma mais consistente e integrada.
Entre outras intervenções a esse respeito, tive oportunidade de escrever, em comunicado para a imprensa, nas vésperas do XXVI Congresso de Pneumologia (primeiro desta Direção), em Dezembro de 2010, que… «associado ao Plano Nacional de Saúde que vigora até ao final deste ano, existem coordenações nacionais para as doenças oncológicas, cardiovasculares, mentais, e para a infeção VIH/SIDA» e que «as doenças respiratórias não estão incluídas nos eixos estratégicos para a área da saúde em Portugal, o que pode ser considerado um absurdo, uma vez que, no seio da patologia respiratória, existem diversos quadros clínicos que são responsáveis por uma elevadíssima morbilidade, mortalidade e diminuição da qualidade de vida dos portugueses».
Com efeito, é atualmente reconhecido o enorme impacto das doenças crónicas não transmissíveis, que incluem doenças respiratórias, doenças cardiovasculares, diabetes tipo 2 e doenças oncológicas, que condicionam 86% da mortalidade nos países desenvolvidos, situando-se as de âmbito respiratório em segundo lugar, não sendo alheio a este facto o envelhecimento da população e a ainda elevada prevalência dos hábitos tabágicos nestes países.
Adicionalmente, os números referentes a diversos indicadores nesta área, em Portugal, apontam para a responsabilidade da doença respiratória em cerca de 20% dos internamentos hospitalares, para uma percentagem ainda mais elevada associada ao recurso aos serviços de urgência (superior a 30% em períodos «críticos») e sobretudo para quase 20% dos óbitos diretamente com ela relacionada, apesar dos significativos progressos obtidos na identificação e no controlo destas patologias.
Com a extinção do Alto Comissariado da Saúde, a Direção Geral da Saúde chamou a si a responsabilidade da «coordenação nacional da definição e desenvolvimento dos programas de saúde», tendo constituído 3 novas áreas de intervenção, uma das quais referente às Doenças Respiratórias, de acordo com o Despacho n.° 404/2012, 2.a série, n.° 10, de 13 de janeiro.
Constituindo um momento de satisfação pessoal e institucional, é igualmente de assinalável dimensão a responsabilidade atual da pneumologia portuguesa.
Aliás, num momento em que, entre outros compromissos:
- a)
se definem recomendações clínicas estruturadas e fundamentadas na mais recente evidência científica (embora sob o muito discutido e discutível formato de «Normas de Orientação Clínica», designação que lhes atribui um cunho jurídico pouco consentâneo com a variabilidade e a elasticidade determinadas pela prática clínica e com a abordagem personalizada da medicina moderna),
- b)
se tentam estabelecer ajustes legislativos para a proteção do cidadão relativamente ao tabagismo passivo,
- c)
se discute a constituição de novas competências na área das doenças respiratórias, como acontece com os distúrbios respiratórios do sono,
- d)
se vêm criando condições institucionais para a partilha científica interdisciplinar, através de diversos protocolos de cooperação recentemente estabelecidos, e
- e)
se manifestam, em contraponto, paixões, como tal, nem sempre orientadas pela razão e acomodadas no bom senso, relativamente a regras e requisitos de prescrição terapêutica,
a Pneumologia deve assumir, sem complexos de inferioridade nem de superioridade, de forma tranquila e transparente, o Programa Nacional para as Doenças Respiratórias como um desígnio vital para a melhoria da condição respiratória da população portuguesa.
Alicerçado em 4 alíneas representando áreas de influência bem identificadas, como a asma brônquica, a doença pulmonar obstrutiva crónica, a síndrome de apneia do sono e uma vertente de patologias menos frequentes, mas de alta diferenciação, que inclui a hipertensão pulmonar, a patologia intersticial e a fibrose quística, este programa é uma oportunidade para enfrentar, sistematizadamente, a doença respiratória como um problema prioritário de saúde em Portugal.
Com espírito de partilha, sem exibições ou protagonismos excessivos, mas, fundamentalmente, com a confiança num futuro melhor para a saúde respiratória dos nossos cidadãos.
A bem dos nossos doentes!