A síndroma de apneia obstrutiva do sono (SAOS) caracteriza-se por episódios repetidos de obstrução da via aérea superior, hipoxemia nocturna e fragmentação do sono. A hipersonolência diurna constitui um sintoma frequente nos doentes com esta síndroma, embora possa estar ausente. A sua presença representa uma limitação significativa da qualidade de vida do indivíduo, bem como um aumento da morbilidade e mortalidade da SAOS, visto ser um importante factor de risco para acidentes de viação e laborais, podendo originar alterações cognitivo-comportamentais relevantes.
O mecanismo desencadeante de hipersonolência diurna não é claro. Alguns autores relacionaram esta com a arquitectura anormal do sono, o que, no entanto, não foi confirmado por outros investigadores. Alguns estudos salientaram a relação entre a hipersonolência diurna e os níveis de dessaturação nocturna da oxi-hemoglobina, mas este facto não foi comprovado cientificamente.
O objectivo do presente trabalho foi analisar quais os mecanismos responsáveis pela sonolência diurna nos doentes com SAOS. Assim, numerosas variáveis registadas no estudo polissonográfico foram compara das em dois grupos de indivíduos com esta patologia, apresentando um deles hipersonolência diurna inequívoca e o outro a total ausência da mesma.
Foram avaliados 65 indivíduos seguidos no Departamento Respiratório do Hospital Universitário do Son Dureta (Palma de Maiorca) que possuíam no registo poligráfico nocturno um índice de apneia/hipopneia (IAH) >20/h. A sonolência excessiva foi determinada utilizando a escala de sono de Epworth (ESE) e o teste de latência múltipla. A sua presença foi considerada sempre que o score de ESE >10 e o score do teste de latência múltipla <5min. A ausência da mesma era determinada por um score de ESE <10 e um teste de latência >10min.
Cerca de 25 indivíduos foram excluídos devido a discrepância entre os resultados das referidas determinações. Dos 40 doentes restantes, 23 apresentavam hipersonolência diurna e 17 não. Nenhum dos indivíduos sofria de doença crónica, nomeadamente DPOC, cirrose hepática, disfunção tiroideia, artrite reumatóide, insuficiência renal crónica ou fazia qualquer tipo de medicação.
O diagnóstico de SAOS foi estabelecido por polissonografia nocturna com registo de múltiplas variáveis, como sejam electroencefalograma (EEG), electromiograma (EMG) mentoniano, electrooculograma, fluxo oronasal, movimentos toracoabdominais e oximetria de fluxo. Apneia foi definida como a interrupção de fluxo oronasal >10s e hipopneia como uma redução >50% do fluxo por um período >10s associado a uma descida >4% da SaO2 ou despertar. O índice de apneia/hipopneia (IAH) consiste no somatório do número de apneias e hipopneias por hora de sono. Os estádios do sono foram classificados de acordo com os critérios de Rechtschoffen e Kales. A latência do sono foi definida como o período compreendido entre o acto de deitar e os primeiros 30s do estádio I e a eficiência do sono como a duração do sono nocturno expressa como percentagem do tempo total de permanência no leito. De acordo com os critérios da American Sleep Disorders Association Task Force, os despertares foram definidos como despertares de origem respiratória quando ocorriam 3s após uma apneia, hipopneia ou ressonar, sabendo que existem outros tipos de despertares (espontâneos, relacionados com os movimentos periódicos dos membros e técnicos). O total de despertares foi determinado pela soma de cada tipo dos mesmos.
A hipersonolência subjectiva foi avaliada utilizando a ESE constituída por 8 itens a que são atribuídos um score de 0 a 3. A avaliação objectiva é obtida através do teste de latência múltipla de acordo com as guidelines internacionais. Um score <5min traduz hipersonolência diurna e >10min a sua ausência.
Foram estudados, no total, 23 indivíduos do sexo masculino com hipersonolência diurna (ESE: 17±3; teste latência múltipla: 4±1min) e 17 sem sonolência excessiva (ESE: 5±2 e teste latência: 16±3min). Ambos os grupos presentaram um IAH similar (62±18/h versus 60±20/h). Os doentes com hipersonolência possuíam um tempo de latência inferior (11±16 versus 18±18min) e uma maior eficiência do sono (90±7 versus 82±13%) do que os indivíduos sem sonolência excessiva. Os primeiros apresentavam uma menor oxigenação (Sat O2 mínima 69±12 versus 79±8%; Sat O2 média 87±6 versus 90±5%).
A distribuição dos estádios do sono e o índice de despertar não diferiu entre os grupos.
Verificou-se, assim, que doentes com SAOS e sonolência diurna excessiva se caracterizavam por um tempo de latência do sono inferior, uma maior eficiência do sono e uma oxigenação nocturna pior em relação aos indivíduos sem hipersonolência diurna. A hipoxemia nocturna parece ser o factor determinante major da hipersonolência diurna dos doentes com SAOS.
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