A doença pulmonar obstrutiva crónica (DPOC) tem sido, ao longo dos anos, uma importante causa de morbilidade e mortalidade no mundo. Em 1995, a implementação de um rastreio da função respiratória pareceu a forma mais adequada para alertar para os sintomas respiratórios negligenciados e sensibilizar para os rastreios espirométricos. Em 2002, foram criadas novas normas consensuais de diagnóstico e o reconhecimento de que a prevalência da DPOC depende dos critérios de definição de obstrução das vias aéreas. O objetivo deste estudo foi revisitar estes 2 estudos e publicar alguns dos resultados e respetivas metodologias.
MétodosDos 12 684 indivíduos que constavam da base de dados do Pneumobil, apenas os indivíduos com 40 e mais anos (n = 9061) foram considerados para esta análise. No estudo de 2002 foi incluída uma amostra aleatorizada e representativa de 1384 indivíduos, com idades entre os 35 e os 69 anos.
ResultadosA prevalência da DPOC foi de 8,96% no estudo Pneumobil e de 5,34% no estudo de 2002. Em ambos os estudos, a presença da DPOC foi superior no sexo masculino, tendo-se verificado uma associação positiva entre a presença da DPOC e os grupos etários mais velhos. Nos fumadores e ex-fumadores encontrou-se maior proporção de casos com DPOC.
ConclusõesA prevalência em Portugal é mais baixa do que noutros países europeus, o que pode estar relacionado com uma menor prevalência de tabagismo. De um modo geral, os fatores de risco mais importantes que mostraram a associação com a DPOC foram a idade maior do que 60 anos, o sexo masculino e a exposição tabágica. Todos os aspetos e as limitações que se referem a diferentes critérios de definição e a metodologias de recrutamento realçam a necessidade de métodos padronizados para determinar a prevalência da DPOC e os fatores de risco associados, cujos resultados possam ser comparados entre países, como acontece no projeto BOLD.
Chronic Obstructive Pulmonary Disease (COPD) has been a leading cause of morbidity and mortality worldwide, over the years. In 1995, the implementation of a respiratory function survey seemed to be an adequate way to draw attention to neglected respiratory symptoms and increase the awareness of spirometry surveys. By 2002 there were new consensual guidelines in place and the awareness that prevalence of COPD depended on the criteria used for airway obstruction definition. The purpose of this study is to revisit the two studies and to turn public some of the data and respective methodologies.
MethodsFrom Pneumobil study database of 12,684 subjects, only the individuals with 40+ years old (n = 9.061) were selected. The 2002 study included a randomized representative sample of 1,384 individuals with 35-69 years old.
ResultsThe prevalence of COPD was 8.96% in Pneumobil and 5.34% in the 2002 study. In both studies, presence of COPD was greater in males and there was a positive association between presence of COPD and older age groups. Smokers and ex-smokers showed a higher proportion of cases of COPD.
ConclusionsPrevalence in Portugal is lower than in other European countries. This may be related to lower smokers’ prevalence. Globally, the most important risk factors associated with COPD were age over 60 years, male gender and smoking exposure. All aspects and limitations regarding different recruitment methodologies and different criteria for defining COPD cases highlight the need of a standardized method to evaluate COPD prevalence and associated risks factors, whose results can be compared across countries, as it is the case of BOLD project.
A doença pulmonar obstrutiva crónica (DPOC) é uma crescente causa de morbilidade e mortalidade no mundo1,2, em que Portugal não é exceção3.
Em 1990, a DPOC foi a sexta causa de morte no mundo, encontrando-se em 12.° lugar no ranking de disability-adjusted life years ([DALY] anos de vida ajustados à incapacidade)4,5. As estimativas apontam para que esteja em 5.° no ano 2020, podendo ser nessa altura a terceira causa de morte5–7. Esta situação levou ao desenvolvimento da Iniciativa Global para a DPOC (Global Initiative for COPD [GOLD])7, cujo objetivo primário é o controlo e a reversão do impacto que a DPOC constitui.
Evolução históricaEm 1995, tanto a American Thoracic Society (ATS) como a European Respiratory Society (ERS) publicaram dados de prevalência de obstrução das vias respiratórias na população geral, bem como um plano de padronização do diagnóstico da DPOC8,9.
Por esta altura, em Portugal, a informação disponível sobre a prevalência das doenças respiratórias era escassa e a avaliação e o rastreio da função pulmonar não eram práticas regulares do programa de diagnóstico10.
Durante muitos anos, as manifestações iniciais da DPOC eram indetetáveis, passando despercebidas tanto a médicos como a doentes, uma vez que a caracterização da função respiratória raramente era requisitada na patologia inflamatória das vias aéreas10.
A implementação de um rastreio da função respiratória pareceu então a melhor forma de alertar o público em geral e os médicos e profissionais de saúde para os sintomas antes desvalorizados e quantificar as perturbações associadas a este problema de saúde.
O primeiro estudo Pneumobil decorreu em Portugal, entre 1995 e 1997, com o objetivo de estimar a prevalência da DPOC, da asma e dos sintomas respiratórios e caracterizar os fatores de risco associados na população portuguesa com mais de 18 anos.
Em 1998, foi lançada a GOLD11 tendo, em 2001, sido publicadas as recomendações7 para a classificação da DPOC.
Os principais objetivos da GOLD são o aumento do conhecimento sobre a DPOC, a diminuição da mortalidade e morbilidade, a melhoria dos métodos preventivos e de gestão da doença através de um esforço global de todos os envolvidos nos sistemas de saúde a nível mundial, bem como a promoção de um renovado interesse na investigação desta patologia de elevada prevalência7.
O principal problema com que a GOLD se deparou foi a informação incompleta sobre a prevalência e as causas da DPOC em vários países7.
Por esta altura existiam novas recomendações consensuais e a consciência de que a prevalência da DPOC na população geral depende muito dos critérios usados para a definição de obstrução das vias aéreas, sendo que os dados de vários países mostravam valores de prevalência muito variados12.
Considerando os aspetos destacados na GOLD, foi implementado o estudo de prevalência de 2002, cujo objetivo foi calcular as taxas de prevalência da DPOC e avaliar a gravidade da obstrução, os hábitos tabágicos e outros fatores de risco em Portugal.
Mesmo com a implementação da GOLD, a DPOC continua nos dias de hoje classificada em 4.° lugar nos países desenvolvidos, com aproximadamente 2,75 milhões de mortes por ano, o que representa 4,8% do total de mortes11. Continua a ser uma doença sub-reconhecida, sub-diagnosticada e sub-tratada, sendo muitas vezes diagnosticada demasiado tarde13–15. A abordagem da GOLD a esta patologia aparentemente sobrestima a DPOC na população mais velha, subestimando-a em jovens adultos. Assim, levanta-se de novo a questão sobre quais os critérios a adotar para definir a obstrução e quais as equações de referência apropriadas às populações16.
Em 2004, a iniciativa Burden of Obstructive Lung Disease (BOLD) desenvolveu métodos padronizados para estimar a prevalência e o impacto económico da DPOC na população15. Estes métodos podem ser usados em países de todos os níveis de desenvolvimento. O objetivo do BOLD é medir a prevalência mundial da DPOC e seus fatores de risco em adultos com 40 e mais anos e investigar a variação de prevalências por idade, sexo e hábitos tabágicos em vários países15.
O estudo BOLD foi também implementado em Portugal, em 2008, aguardando-se a publicação dos seus resultados.
A finalidade deste trabalho foi revisitar 2 estudos de prevalência feitos em Portugal há alguns anos, de modo a publicar alguns dos resultados e respetivas metodologias, já que os dados de ambos os estudos se dispersam por comunicações, posters, dados parciais incluídos em livros, comunicações orais não publicadas e publicações em revistas indisponíveis, o que dificulta a pesquisa de informação10,12,17,18. Por outro lado, apresenta-se aqui pela primeira vez a análise de uma fração dos resultados da população com mais de 40 anos do estudo Pneumobil.
Material e métodosA metodologia foi diferente para cada um dos 2 estudos.
Metodologia do estudo PneumobilDecorreu entre setembro de 1995 e dezembro de 1997 em 17 dos 18 distritos de Portugal continental.
O inquérito foi aplicado aos voluntários que se deslocaram aos pontos de recolha de informação localizados em locais públicos, aceitaram responder a um questionário e realizar um teste espirométrico.
No estudo, foram incluídos 14 002 indivíduos dos quais apenas foram considerados elegíveis (questionário completo e espirometria aceitável) 12 684 adultos com mais de 18 anos de idade.
Para esta análise, selecionaram-se, da base de dados total, apenas os indivíduos com mais de 40 anos (n = 9061).
O questionário baseou-se no ATS Respiratory Questionnaire e incluiu parâmetros demográficos, hábitos tabágicos, atividade profissional, atividade física, exposição ao pó e poeiras químicas, história de doença com efeitos na função respiratória e medicação atual.
A espirometria foi realizada de acordo com as normas ATS19, com avaliação pré- e pós-broncodilatador (BD) (2 inalações de salbutamol, 200μg), usando espirómetros electrónicos Masterscreen IOS (Jaeger), versão 4,3, com pneumotacógrafo Silverman.
Metodologia do estudo de prevalência de 2002Este estudo epidemiológico decorreu entre Outubro de 2001 e Março de 2002 em todos os distritos de Portugal continental, estratificados por região, idade e género, de acordo com os dados demográficos do Instituto Nacional de Estatística ([INE] censo de 2001)20.
A amostra foi selecionada aleatoriamente da lista telefónica e, ao aceitarem participar no estudo, foi marcada data e hora para responder ao questionário e para medições espirométricas. Devido ao número reduzido de respostas, foi necessário contactar 11 500 indivíduos para se obter a amostra significativa definida. Foram incluídos 1475 indivíduos com idade entre 35 e 69 anos, com taxa de participação de 12,8%. Destes, apenas 1384 foram considerados elegíveis (questionário completo e espirometria aceitável). No entanto, esta amostra foi considerada representativa da população portuguesa. Excluíram-se os indivíduos com mais de 70 anos para evitar recusa dos mais velhos o que poderia resultar num viés considerável, tal como aconteceu no estudo Iberpoc21.
O questionário foi o mesmo do estudo anterior. A espirometria foi realizada de acordo com as recomendações da ATS19, com espirómetro Vitalograph alpha III® equipado com adaptadores de boca SafeTway® (pneumotacógrafo de Fleisch).
Neste estudo não foi realizado teste de reversibilidade por razões éticas e operacionais (por exemplo, não estar presente um médico na realização do teste espirométrico).
DefiniçõesEm ambos os estudos, a DPOC foi definida pela presença de VEMS/CVF < 70% (pós-BD no estudo Pneumobil e pré-BD no estudo de 2002), com ou sem sintomas, de acordo com a definição da GOLD7. A asma e outras patologias respiratórias foram excluídas pelo questionário aplicado. Os indivíduos com sintomas e VEMS/CVF > 70% foram excluídos, não sendo considerados DPOC.
A gravidade da DPOC foi baseada nos critérios da GOLD e nos valores de referência ECCS, sendo adaptada no estudo de 200222.
Os dados do Pneumobil foram reanalisados de acordo com os critérios da GOLD, que não existiam à data de realização do estudo.
Análise estatísticaDe acordo com os objetivos desta publicação apenas se apresentam os principais resultados resultantes da análise dos 2 estudos.
As variáveis qualitativas são descritas através de frequências absolutas (n) e relativas (%).
A prevalência da DPOC foi calculada para o total de indivíduos e por sexo e hábitos tabágicos.
As análises estatísticas utilizaram o software SPSS® versão 16.0.
ResultadosNa tabela 1 descrevem-se as características sociodemográficas das amostras de ambos os estudos. No Pneumobil, de 9061 indivíduos incluídos, 62,8% eram do sexo masculino, 13,3% fumadores e 63,6% eram não fumadores.
Características socio-demográficas da população estudada nos estudos Pneumobil e 2002
Estudo Pneumobil (≥ 40 anos) | Estudo 2002 (35-69 anos) | |
---|---|---|
Tamanho da amostra | 9061 | 1384 |
Idade média | 56,4 (± 15,9) | 49 (± 9,2) |
Sexo | ||
Masculino | 5690 (62,8%) | 685 (49,5%) |
Feminino | 3371 (37,2%) | 699 (50,5%) |
Hábitos tabágicos | ||
Fumadores | 1201 (13,3%) | 352 (25,4%) |
Ex-fumadores | 2097 (23,1%) | 303 (21,9%) |
Não fumadores | 5763 (63,6%) | 729 (52,7%) |
Valores apresentados em n (%).
No estudo 2002, de 1384 indivíduos incluídos, 49,5% eram do sexo masculino, 25,4% fumadores e 52,7% eram não fumadores.
Como se mostra nas figuras 1 e 2, a prevalência global da DPOC na população estudada no estudo Pneumobil foi de 8,96% (idade ≥ 40 anos), sendo 11,9% no sexo masculino e 5,9% no sexo feminino. No estudo 2002, a prevalência da DPOC identificada foi 5,34% (idades 35-69 anos), 6,3% no sexo masculino e 4,5% no sexo feminino. Nestas 2 figuras mostra-se também a distribuição dos casos de DPOC por sexo e idade. Mais de 61% de casos encontravam-se no Pneumobil acima dos 60 anos de idade vs. mais de 32% no estudo 2002. No Pneumobil, 26,5% dos casos foram identificados acima dos 70 anos. No estudo 2002 este limite de idade não foi estudado. Por outro lado, salienta-se que abaixo dos 60 anos a proporção de casos identificados foi significativamente mais elevada no sexo feminino no estudo 2002 comparativamente ao Pneumobil (29,8 vs. 10,8%).
Quanto aos hábitos tabágicos nos casos de DPOC que se encontraram em ambos os estudos, no Pneumobil a prevalência em fumadores era de 15,4% e em não fumadores era de 6,7%. No estudo de 2002 a prevalência em fumadores era de 8,8% e em não fumadores de 4,4%.
Nas figuras 3 e 4 mostra-se a distribuição da gravidade de DPOC (GOLD no estudo Pneumobil e adaptada à GOLD no estudo de 2002). Em ambos os estudos, verificou-se que a proporção da combinação dos estádios i e ii foi semelhante, 83,9% no Pneumobil e 87,8% no estudo 2002. Contudo a prevalência foi superior para o estádio GOLD I no estudo 2002 (47,3 vs. 30,8%). Por outro lado, e apesar do limite etário de 69 anos no estudo 2002, a proporção combinada dos estádios GOLD III e IV foi aproximada, ainda que ligeiramente superior no Pneumobil (16,1 vs. 12,2%).
Na tabela 2 apresenta-se a distribuição de casos de DPOC por hábitos tabágicos e gravidade. No Pneumobil, 21,2% dos casos de DPOC verificaram-se em fumadores, enquanto no estudo 2002 o valor duplicou para 41,9%. Como referido anteriormente, a prevalência de fumadores no Pneumobil (13,3%) foi inferior ao estudo 2002 (25,4%).
Prevalência da DPOC por hábitos tabágicos e estádio GOLD
Estádios GOLD | Estudo Pneumobil (≥ 40 anos) | Estudo 2002 (35-69 anos) | ||||
---|---|---|---|---|---|---|
Fumadores | Ex-fumadores | Não fumadores | Fumadores | Ex-fumadores | Não fumadores | |
I | 34,1% | 23,5% | 38,3% | 48,4% | 27,3% | 53,1% |
II | 51,9% | 54,6% | 49,5% | 38,7% | 63,6% | 34,4% |
III | 11,9% | 18,2% | 10,6% | 12,9% | 9,1% | 9,4% |
IV | 2,2% | 3,6% | 1,6% | 0,0% | 0,0% | 3,1% |
Em ambos os estudos, a proporção de não-fumadores foi muito semelhante, a saber, cerca de 44%. No entanto, a prevalência da DPOC neste grupo foi mais elevada no Pneumobil do que no estudo 2002 (6,7 vs. 4,4%).
De um modo geral, a distribuição de casos por hábitos tabágicos e gravidade (tabela 2) sobrepõe-se à distribuição geral por níveis de gravidade verificada em ambos os estudos (figs. 3 e 4), com cerca de 85 a 90% de casos nos estádios i e ii. Para os estádios mais graves a tendência encontrada por hábitos tabágicos foi semelhante em ambos os estudos. Contudo, para o estádio iii os ex-fumadores do estudo 2002 foram 9,1% dos casos, enquanto no Pneumobil foram 18,2% (tabela 2). A diferença nos limites etários e a maior percentagem de ex-fumadores no Pneumobil são possíveis justificações para estes resultados.
DiscussãoNestes estudos existem 3 limitações major e importantes: 1) quanto ao Pneumobil, não se trata de um verdadeiro estudo aleatório; 2) quanto ao estudo de 2002, o critério de DPOC não se baseou na espirometria pós-BD; 3) os critérios para obstrução diferem entre os estudos, de tal modo que os resultados de prevalência não se podem comparar. No entanto, alguns resultados valem por si mesmos.
Nos 2 estudos encontram-se diferentes números para a prevalência da DPOC e estes diferentes valores são explicáveis pelas diferenças de metodologia. No Pneumobil o intervalo etário foi maior, tendo sido incluídos indivíduos com mais de 70 anos. Ainda que o critério da relação fixa para obstrução possa sobrestimar a prevalência neste limite etário, esta estimativa é possivelmente mais real do que a do estudo 2002, uma vez que neste foram excluídos os indivíduos com mais de 69 anos. A prevalência obtida através do estudo 2002 poderá ser adequada para os limites etários estudados, sendo certamente uma subestimativa da população geral.
Apesar de a população mais idosa poder não ser abrangida, por não se deslocar aos centros de recolha (uma razão possível para a baixa prevalência em participantes maior que 70 anos no estudo Pneumobil), isso foi levado em conta no desenho do estudo de 2002, que excluiu este grupo etário, mas que não veio a traduzir-se em diferenças significativas nesses graus de gravidade. No entanto, no Pneumobil observaram-se estádios mais graves de doença, o que pode ter subestimado a prevalência da DPOC no estudo 2002.
O período temporal diferente pode ser outra justificação para as diferenças encontradas. A prevalência conhecida de hábitos tabágicos em Portugal não era diferente em 1995 vs. 2002 (total 17,3 vs. 18,0%), exceto num ligeiro acréscimo em mulheres fumadoras (6,5 vs. 7,9%)23.
O tipo de aleatorização no Pneumobil é uma razão possível para a baixa prevalência de fumadores e de ex-fumadores. A ocorrência de mais mulheres em idade jovem no estudo de 2002 também pode dever-se a esta diferença de período temporal.
Se bem que a taxa de participação no estudo de 2002 tenha sido muito baixa, a representatividade e o processo de seleção ao acaso da amostra incluída foram assegurados, o que é um valor acrescentado neste estudo.
Um possível fator para as discrepâncias encontradas entre os 2 estudos foi o facto de o Pneumobil não ter sido verdadeiramente aleatorizado, uma vez que os indivíduos se dirigiam voluntariamente aos locais de inquérito (os habitantes que residissem longe dos locais de recolha podem ter ficado excluídos). No entanto, numa amostra de 12 684 indivíduos este viés poderá ter sido minimizado e a proximidade do veículo de estudo com as pessoas com maior receio de sofrerem de doença, pode ter permitido chegar aos casos mais graves de DPOC.
No estudo 2002 optou-se, por protocolo, não administrar BD para testar a reversibilidade sobretudo por razões éticas e operacionais, à semelhança de estudos como o NHANES III, que na mesma época mostraram esta limitação24.
Apesar de não ter sido possível aplicar os critérios da GOLD (devido à ausência do teste de reversibilidade, que pode sobrestimar os casos de DPOC) os resultados poderão ser aceites uma vez que a asma e outras limitações respiratórias crónicas foram excluídas, através do questionário. Esta é também a opinião de Fukuchi et al.25 num estudo de prevalência japonês.
Outro aspeto importante foi o facto de os 2 estudos terem sido feitos com espirómetros diferentes. Enquanto no Pneumobil não há razão para suspeitar de erros associados, o mesmo não acontece para o estudo 2002. Uma possível limitação do valor de CVF (devido ao software cortar os valores a baixos débitos) pode ter acontecido porque o valor mediano para a relação VEMS/CVF na amostra total foi maior do que o esperado (84,4%). Assim, a taxa de prevalência estimada usando o critério da taxa fixa pode, na verdade, ter sido subestimada no estudo de 2002.
Os resultados apresentados foram consistentes com outros estudos8,21,26, em que se observaram prevalências superiores no sexo masculino. O aumento com a idade é um fator importante relacionado com a prevalência, verificando-se que a população mais velha apresenta um risco acrescido para a DPOC, independentemente da sua história tabágica.
De um modo geral, os fatores de risco mais importantes associados com a DPOC nestes estudos foram a idade superior a 60 anos, o sexo masculino e a exposição tabágica.
No entanto, a presença de uma proporção significativa de casos de DPOC em não-fumadores poderá indicar a existência de outros fatores de risco na população portuguesa (por ex. exposição a biomassa, antecedentes de doença respiratória, infeções na infância).
Em estudos de prevalência futuros esperam-se valores de prevalência de DPOC superiores uma vez que se deverão corrigir as limitações principais destes 2 estudos, quanto à subvalorização (espetro de idades, aleatorização, espirómetros adequados, uso de espirometria pós-BD).
ConclusõesEstes estudos contribuíram para o conhecimento da prevalência da DPOC em Portugal, verificando-se uma ocorrência inferior a outros países da Europa. Estes resultados surgem como consequência de uma menor percentagem de fumadores e hábitos tabágicos.
De um modo geral, os fatores de risco mais importantes associados à DPOC foram a idade superior a 60 anos, o sexo masculino e a exposição tabágica.
Nos 2 estudos, os estádios GOLD I e II de DPOC contabilizaram mais de 85% de casos, o que sugere a necessidade de especial atenção na abordagem à espirometria, sua qualidade e problemas associados.
Apesar de mais frequente nos fumadores e ex-fumadores, verificou-se a ocorrência de DPOC com alguma frequência em não-fumadores, homens e mulheres, o que leva à necessidade de, no futuro, prestar maior atenção a outros fatores que possam estar associados a esta patologia.
Todos os aspetos e as limitações associados à metodologia dos estudos em análise apontam para a necessidade de métodos padronizados para a avaliação da prevalência da DPOC e os fatores de risco associados que permitam a comparação de resultados entre países, como é o caso do projeto BOLD15.
Acreditamos que o esforço concertado das várias entidades envolvidas no sistema de saúde, incluindo entidades governamentais, representantes de saúde pública, investigadores em saúde e mesmo o público em geral, todos são parte integrante necessária para controlar este importante problema de saúde pública7.
FinanciamentoAmbos os estudos foram conduzidos pela Sociedade Portuguesa de Pneumologia e financiados pela Boehringer Ingelheim e Pfizer.
Conflito de interessesAmbos os estudos foram conduzidos pela Sociedade Portuguesa de Pneumologia e financiados pela Boehringer Ingelheim e Pfizer.
Os autores agradecem aos seguintes intervenientes:
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Comissão de Trabalho do Pneumobil e estudo 2002, com o apoio científico da Sociedade Portuguesa de Pneumologia, em particular ao Prof. J.H. Paiva de Carvalho, Prof. António Couto, Prof. Bensabat Rendas, Dr. J. Pontes da Mata, Dra. Isabel Melo, Dr. Paes Cardoso.
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Comissão de Honra: Prof. A.J.A. Robalo Cordeiro, Prof. M. Freitas e Costa, Prof. Ramiro Ávila e Prof. J. Agostinho Marques.
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Escola Superior de Tecnologia da Saúde de Coimbra (Prof. Jorge Conde) e à Associação Portuguesa de Cardiopneumologistas (Luís Caldeira) e a todos os técnicos de Cardiopneumologia envolvidos nos estudos, em especial a Alexandra Guardado e Helena Pedrosa.
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Prof. António Gouveia pelo apoio estatístico prestado.
Um agradecimento especial ao Prof. G. Viegi por toda a simpatia e pela revisão aprofundada e rigorosa dos resultados do estudo 2002.
Os investigadores gostariam ainda de agradecer ao Carlos Capela, coordenador do projeto da parte do promotor, Drs. Ana Durão e José Antunes e a todos os envolvidos da Boehringer Ingelheim Portugal e Pfizer pela sua colaboração neste projeto.