As normas internacionais para o tratamento da asma brônquica recomendam que os doentes com sintomatologia mal controlada com doses baixas/ /intermédias de corticosteróides (CT) inalados sejam submetidos a doses mais elevadas de CT e, se necessário, deverá ser adicionado um β2 agonista de longa duração. No entanto, estudos mais recentes demonstraram que a adição deste fármaco a doses baixas/moderadas de CT inalados permite um melhor controlo da sintomatologia do que a duplicação da dose de CT. O formoterol constitui o β2 agonista de eleição devido ao seu início de acção rápida.
O objectivo do presente trabalho foi comparar a eficácia da associação do β2 agonista formoterol a doses médias/elevadas de CT inalados com a duplicação da dose do CT em indivíduos com asma moderada/grave mal controlada.
Foram avaliados doentes com idade superior a 18 anos com asma moderada e grave que apresentavam um FEV1≥50% do previsto e um aumento≥15% do referido parâmetro após inalação de um broncodilatador de curta duração, tendo sido submetido a terapêutica com CT inalados diariamente (dipropionato de beclometasona 1000μ - budesonida 800μg) no mês que precedeu o início do estudo em análise. A existência de, pelo menos, dois dos parâmetros seguintes, nos últimos 7 dias do período de run-in, foi imprescindível: sintomatologia interferindo com as actividades de vida diária; interrupção do sono por sintomas nocturnos, necessidade de terapêutica de alívio numa dose≥4 puffs salbutamol/dia; variabilidade diária do PEF (Peak Expiratory Flow)≥15%.
Foram critérios de exclusão: doentes cuja dose do CT inalado diária foi alterada no último mês; indivíduos submetidos a CT oral ou β2 agonista de longa duração no mês precedente; doentes com dificuldade de utilizar o aerolizer apesar da instrução adequada.
Tratou-se de um estudo randomizado, duplamente cego, envolvendo 203 indivíduos: 102 submetidos a formoterol 12μg e dipropionato de beclometasona 500μg duas vezes/dia; 101 sob este corticosteróide na dose de 1000μg duas vezes/dia e placebo. Ambos os grupos foram tratados com os referidos fármacos durante 12 semanas. Os doentes estudados apresentavam um FEV1 72% do previsto, uma reversibilidade desencadeada pelo (β2 agonista de curta duração de 27%, scores de sintomas moderados e necessidade de terapêutica de alívio na dose≥5 puffs de salbutamol/ dia.
A diferença do PEF entre os dois grupos foi de 27,78 1/minuto, sendo favorável à associação formoterol/beclometasona (p=0,0002). Foi observada, também, uma diferença estatisticamente significativa na relação cortisol/ creatinina urinário após o tratamento de 12 semanas (p=0,001), indicando supressão do eixo hipotalâmico-hipofisário nos doentes sob 1000μg de dipropionato de beclometasona duas vezes/ dia. Os scores de sintomas foram significativamente mais baixos nos doentes sob terapêutica combinada, sendo a proporção de doentes livres de sintomas durante o dia duas vezes superior neste grupo e a utilização de terapêutica de alívio inferior.
COMENTÁRIOEste estudo demonstra que, no tratamento de doentes com asma moderada/grave não controlada com dipropionato de beclometasona 1000μg/dia, a adição de formoterol 12μg duas vezes/dia é mais eficaz do que a duplicação da dose de beclometasona.
A terapêutica combinada melhora significativamente os parâmetros objectivos da obstrução das vias aéreas quando comparada com altas doses de corticosteróides inalados. O efeito benéfico de adição de formoterol na função pulmonar tornou-se evidente após quatro semanas de tratamento e permaneceu inalterada até ao fim do estudo. Este efeito pode dever-se ao antagonismo funcional do formoterol à contracção do músculo liso, à sua capacidade de estabilizar os mastócitos ou de reduzir o edema da parede brônquica.
As exacerbações ligeiras e moderadas ocorreram com maior frequência no grupo sob altas doses de CT inalados. Estes resultados foram sobreponíveis aos observados anteriormente em doentes com asma ligeira submetidos à associação formoterol/budesonido (dose baixa/intermédia) ou a doses elevadas deste último fármaco. Também neste estudo se verificou um maior número de exacerbações no segundo grupo.
Elevadas doses de CT inalados estão relacionadas com significativos efeitos suprarrenais. Assim, a associação de um β2 agonista de longa acção (formoterol) permite o controlo da doença sem necessidade de doses altas de CT inalados. Neste estudo, o quociente cortisol/creatinina urinário foi significativamente menor no grupo sob corticoterapia em dose elevada do que nos indivíduos submetidos a terapêutica combinada, traduzindo uma maior supressão do risco hipotalâmico-hipofisário no primeiro caso. Estes achados vieram confirmar a observação de que o dipropionato de beclometasona na dose≥1500μg/dia exerce um efeito supressor significativo na libertação de cortisol endógeno.
A terapêutica combinada de CT inalados e β2 agonistas de longa acção permitiu um bom controlo da asma brônquica, comparativamente a baixas doses de CT, e conduziu à administração dos fármacos inalados em doses fixas através de um dispositivo único. Ringdal e colaboradores compa-raram a eficácia do salmeterol 50μg/ fluticasona 250μg utilizando Diskus duas vezes/dia com o formoterol 12μg/ budesonido 500μg administrados separadamente através do Turbohaler duas vezes/ /dia. A primeira associação foi significativamente superior na redução das exacerbações de asma e dos sintomas nocturnos, apesar da dose mais baixa de fluticasona comparada com a de budesonido. Estes resultados não são, no entanto, inesperados, visto a fluticasona ser mais potente do que o budesonido.
Apesar de a administração de fármacos em doses fixas num único dispositivo ter vantagens adicionais em termos de aderência ao tratamento e conveniência, não apresenta grande flexibilidade no ajuste da dose durante as exacerbações. São, assim, necessários novos estudos para avaliar os dispositivos mais apropriados, de forma a obter o maior sinergismo de acção entre β2 agonista de longa duração e os CT inalados.
Pulmonary Pharrnacology and Therapeutics 2003; 16: 299-306
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