Journal Information
Vol. 18. Issue 5.
Pages 244-246 (September - October 2012)
Vol. 18. Issue 5.
Pages 244-246 (September - October 2012)
Comentário
Open Access
Personalizando a medicina – estratégias para implementar a avaliação do rearranjo do ‘anaplastic lymphoma kinase’ no carcinoma do pulmão de não pequenas células em Portugal
Personalizing medicine - strategies for implementing the evaluation of anaplastic lymphoma kinase rearrangement in non-small-cell lung cancer in Portugal
Visits
10809
A. Araújoa,
Corresponding author
amfaraujo@netcabo.pt

Autor para correspondência.
, A. Coelhob, R.A. de Melloa, I. Azevedoa, M. Soaresa, H. Queirogac, E. Teixeirad, B. Parentee, F. Barataf
a Serviço de Oncologia Médica, Instituto Português de Oncologia Francisco Gentil, Centro do Porto, Porto, Portugal
b Unidade de Oncologia Molecular, Instituto Português de Oncologia Francisco Gentil, Centro do Porto, Porto, Portugal
c Serviço de Pneumologia, Hospital de S. João, Porto, Portugal
d Serviço de Pneumologia, Centro Hospitalar de Lisboa Norte, Lisboa, Portugal
e Serviço de Pneumologia, Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia / Espinho, Vila Nova de Gaia, Portugal
f Serviço de Pneumologia, Centro Hospitalar de Coimbra, Coimbra, Portugal
This item has received

Under a Creative Commons license
Article information
Full Text
Bibliography
Download PDF
Statistics
Full Text

Em 2008, foram registados em Portugal cerca de 3.300 novos casos de cancro do pulmão e quase o mesmo número de mortes devidas a esta patologia1.

Nas últimas 2 décadas, a melhoria na sobrevivência do carcinoma do pulmão não-pequenas células (CPNPC) foi modesta. Desde 1990, houve várias mudanças no tratamento do CPNPC avançado, incluindo a introdução de novos agentes e regimes de quimioterapia (QT)2, aumento da utilização de QT de salvação3,4, e o desenvolvimento de terapias dirigidas a alvos moleculares, especialmente com os inibidores da tirosina cinase (TKI) do recetor do fator de crescimento epidérmico (EGFR)5. A adaptação do tratamento a cada doente com CPNPC emergiu como um objetivo, particularmente no que se refere ao benefício clínico versus toxicidade.

No entanto, ainda estamos longe desvendar o puzzle das alterações genéticas que conduzem ao desenvolvimento do CPNPC. A caracterização molecular do cancro do pulmão, que conduziu à identificação de diversas alterações moleculares, como mutações no EGFR ou translocações no ALK (anaplastic lymphoma kinase), e a subgrupos de cancro do pulmão com diferente história natural e diferente resposta ao tratamento, em conjunto com o alargamento do leque das opções de tratamento, levantam várias questões. Como selecionar a população certa de doentes para a melhor opção terapêutica? Qual o valor que a sociedade está disposta a despender para a implementação de métodos de caracterização molecular do cancro do pulmão? Como se pode melhorar o custo-efetividade desses métodos? Está a sociedade disposta a suportar o encargo destes novos métodos de diagnóstico molecular e das novas drogas terapêuticas, mesmo que sejam, de alguma forma, custo-efetivas? E, atualmente, será a evidência suficiente para ultrapassar o desafio da contenção de custos?

Pesquisar as mutações no EGFR em doentes com CPNPC avançado ou metastático pode ajudar o médico a determinar quais os que terão maior probabilidade de responder aos inibidores da tirosina cinase do EGFR, adequando a terapia na altura do diagnóstico.

Em Portugal, apresentamos uma análise retrospetiva do resultado da genotipagem do EGFR nos 3 maiores centros do norte do país (Centro Hospitalar de V. N. Gaia, Instituto Português de Oncologia – Centro do Porto, Hospital de S. João), desde Julho de 2006 até Janeiro de 2011 [dados não publicados]. Estudámos 621 doentes, com uma média de idades de 65 anos (20-89 anos), 30% dos quais eram mulheres, 64% apresentavam histologia de adenocarcinoma e 21% tinham carcinoma epidermoide. Descobrimos a presença de mutações no EGFR em 14,3% do total de doentes com CPNPC (17,5% com adenocarcinoma e 9,5% com carcinoma epidermoide), sendo que, destes, 6,3% se localizam no exão 19 (43,8% dos doentes mutados, dm), 5,3% no exão 21 (37,1% dos dm), 1,7% no exão 20 (12,4% dos dm) e 1,0% no exão 18 (6,7% dos dm).

Este trabalho teve início em 2 dos maiores centros há 5 anos, com a seleção de alguns doentes com base nas suas características clínicas. Após a clarificação da importância do papel dos inibidores da TK do EGFR no tratamento de primeira linha do CPNPC avançado ou metastático, estes centros e, posteriormente, o terceiro, começaram a pesquisar as mutações a todos os novos doentes possíveis. Entretanto, iniciou-se uma discussão em fóruns científicos nacionais, envolvendo líderes de opinião e alguns grupos cooperativos, como o Grupo de Estudos de Cancro do Pulmão Português sobre a necessidade de realizar a análise das mutações do EGFR. Estes debates foram fundamentais para trazer a lume questões importantes, como: qual a quantidade de amostra (tecido) de cancro que é necessária, como otimizar o circuito desde a colheita da amostra até à realização da análise, quanto tempo se deve (pode) esperar pelo resultado, e que informação os patologistas e geneticistas devem dar aos médicos que tratam os doentes.

O rearranjo do ALK (ALK+) foi identificado nos doentes com CPNPC como sendo uma inversão no braço curto do cromossoma 2 (2p) com ou sem deleção intersticial, inv(2)(p21p23), resultando num produto de fusão denominado echinoderm microtubule-associated protein-like 4 (EML4)-ALK6. Este oncogene de fusão representa um dos novos alvos moleculares no CPNPC, desempenhando um papel-chave na carcinogénese pulmonar num subgrupo de doentes6,7, que pode ser bloqueado de forma eficaz por pequenas moléculas inibidoras que têm como alvo o ALK.

Este rearranjo (EML4-ALK) é, no entanto, pouco frequente, ocorrendo em 2 a 7% de todos os CPNPC8,9. É mais prevalente em doentes não fumadores ou fumadores «leves» e em doentes com adenocarcinoma7,10,11. Nestes subgrupos populacionais, a prevalência das mutações do EML4-ALK pode rondar os 20-30%12. No entanto, o género, a idade e os hábitos tabágicos não são variáveis sólidas relacionadas com os rearranjos do ALK no CPNPC13.

Não está ainda definido um método padrão para a deteção das mutações EML4-ALK, podendo ser utilizadas várias técnicas moleculares. A hibridação fluorescente in situ (FISH) é a metodologia utilizada atualmente pela maioria de nós e para o recrutamento para ensaios clínicos, embora seja uma técnica dispendiosa e não disponível para a rotina. A padronização de todas as variáveis pré-analíticas, incluindo o manuseamento do tecido, a sua fixação e processamento e a escolha dos anticorpos anti-ALK são essenciais quando se realiza FISH14.

O Crizotinib (PF-02341066, Pfizer) é um inibidor oral, seletivo e competitivo do ATP das TK do ALK e do MET, inibindo a fosforilação da tirosina do ALK ativado em concentrações nanomolares15,16. O primeiro ensaio de fase i publicado avaliou 82 doentes com rearranjos do ALK com CPNPC avançado submetidos a várias terapias prévias8. Com uma duração de tratamento de 6,4 meses, a taxa de resposta global correspondeu a uns impressionantes 57%, com uma taxa de doença estável de 33%. A probabilidade estimada de sobrevivência livre de progressão aos 6 meses foi de 72%, sem se ter atingido a mediana de sobrevivência. A utilização deste fármaco resultou em efeitos laterais gastrintestinais de grau 1 ou 2 (ligeiros).

Numa população não selecionada de doentes com CPNPC, apenas cerca de 4% tem rearranjos do ALK, e esta pequena proporção de doentes ALK+ constitui uma limitação ao acesso à droga relacionada – Crizotinib. A melhor forma de identificar este grupo de doentes e qual o método mais adequado para deteção do ALK+ constitui atualmente material de grande discussão e investigação.

É possível definir 3 grupos de tumores que não apresentam rearranjos do ALK e que podem ser excluídos da pesquisa dos rearranjos do ALK: tumores com mutações ativantes do EGFR, doentes que mostraram resposta objetiva a tratamento prévio com inibidores da TK do EGFR e, eventualmente, tumores sem expressão de TTF-117. No entanto, esta estratégia só permite selecionar os doentes após ser conhecido o resultado do teste da mutação do EGFR ou ser avaliada a resposta aos inibidores da TK do EGFR, perdendo-se, deste modo, 5 a 6 dias úteis, na primeira hipótese, ou de um a 3 meses, na segunda. No que concerne à expressão do TTF-1, este marcador é negativo numa minoria de casos, pelo que a sua relevância para a seleção de doentes ALK+ é marginal.

Em Portugal, o primeiro passo consistirá no envolvimento de alguns dos principais centros, numa população selecionada (CPNPC estadios iv, adenocarcinoma, não-fumadores ou fumadores «leves»), tendo como objetivos a avaliação e otimização dos circuitos necessários, desde a colheita da amostra até à implementação do teste e como obterão os clínicos o resultado. Paralelamente, serão necessários alguns encontros nacionais para discutir a importância do ALK, o teste da sua mutação e o valor do Crizotinib nos doentes ALK+. Após estes passos iniciais, provavelmente 2 ou 3 destes centros principais decidirão realizar a pesquisa da translocação do ALK, para se conhecer a incidência desta mutação na população portuguesa com CPNPC. Estas fases permitirão também a requisição do Crizotinib para doentes ALK+ e adquirir experiência com este fármaco.

Num futuro próximo, todos os clínicos que tratam CPNPC necessitarão de caracterizar o tumor histologicamente e, especificamente, ao nível de alguns alvos moleculares. Estas características influenciarão a escolha dos fármacos a utilizar em cada caso, nomeadamente ao nível dos efeitos adversos relacionados com estes e, obviamente, a sobrevivência. Isto é personalizar a medicina.

Bibliografia
[1]
GLOBOCAN 2008 (IARC). http://globocan.iarc.fr/factsheets/populations/factsheet.asp?uno=620 (11 July 2011, date last accessed)
[2]
P.J. Bunn, k. Kelly.
New chemotherapeutic agents prolong survival and improve quality of life in non-small cell lung cancer: a review of the literature and future directions.
Clin Cancer Res, 4 (1998), pp. 1087-1100
[3]
F. Fossella, R. De Vore, R. Kerr, J. Crawford, R. Natale, F. Dunphy, et al.
Randomized phase III trial of docetaxel versus vinorelbine or ifosfamide in patients with advanced non-small-cell lung cancer previously treated with platinum-containing chemotherapy regimens The TAX 320 Non-Small Cell Lung Cancer Study Group.
J Clin Oncol, 18 (2000), pp. 2354-2362
[4]
F. Shepherd, J. Dancey, R. Ramlau, K. Mattson, R. Gralla, M. O’Rourke, et al.
Prospective randomized trial of docetaxel versus best supportive care in patients with non-small-cell lung cancer previously treated with platinum-based chemotherapy.
J Clin Oncol, 18 (2000), pp. 2095-2103
[5]
G. Giaccone.
Epidermal growth factor receptor inhibitors in the treatment of non-small-cell lung cancer.
J Clin Oncol, 23 (2005), pp. 3235-3242
[6]
M. Soda, Y.L. Choi, M. Enomoto, S. Takada, Y. Yamashita, S. Ishikawa, et al.
Identification of the transforming EML4-ALK fusion gene in non-small-cell lung cancer.
Nature, 448 (2007), pp. 561-566
[7]
M. Soda, S. Takada, K. Takeuchi, Y.L. Choi, M. Enomoto, T. Ueno, et al.
A mouse model for EML4-ALKpositive lung cancer.
Proc Natl Acad Sci USA, 105 (2008), pp. 19893-19897
[8]
E.L. Kwak, Y.J. Bang, D.R. Camidge, A.T. Shaw, B. Solomon, R.G. Maki, et al.
Anaplastic lymphoma kinase inhibition in non-small-cell lung cancer.
N Engl J Med, (2010), pp. 3631693-3631703
[9]
M.G. Kris, B.E. Johnson, D.J. Kwiatkowski, A.J. Iafrate, I.I. Wistuba, S.L. Aronson, et al.
Identification of driver mutations in tumor specimens from 1,000 patients with lung adenocarcinoma The NCI's Lung Cancer Mutation Consortium (LCMC).
J Clin Oncol, 29 (2011),
[10]
S. Perner, P.L. Wagner, F. Demichelis, R. Mehra, C.J. Lafargue, B.J. Moss, et al.
EML4-ALK fusion lung cancer: a rare acquired event.
Neoplasia, 10 (2008), pp. 298-302
[11]
D.W. Wong, E.L. Leung, K.K. So, I.Y. Tam, A.D. Sihoe, L.C. Cheng, et al.
The EML4-ALK fusion gene is involved in various histologic types of lung cancers from nonsmokers with wild-type EGFR and KRAS.
Cancer, 115 (2009), pp. 1723-1733
[12]
A.T. Shaw, B.Y. Yeap, M. Mino-Kenudson, S.R. Digumarthy, D.B. Costa, R.S. Heist, et al.
Clinical features and outcome of patients with non-small-cell lung cancer who harbor EML4-ALK.
J Clin Oncol, 27 (2009), pp. 4247-4253
[13]
J.H. Paik, G. Choe, H. Kim, J.Y. Choe, H.J. Lee, C.T. Lee, et al.
Screening of anaplastic lymphoma kinase rearrangement by immunohistochemistry in non-small cell lung cancer Correlation with fluorescence in situ hybridization.
J Thorac Oncol, 6 (2011), pp. 466-472
[14]
D.G. Hicks, R.R. Tubbs.
Assessment of the HER2 status in breast cancer by fluorescence in situ hybridization: a technical review with interpretative guidelines.
Hum Pathol, 36 (2005), pp. 250-261
[15]
U. McDermott, A.J. Iafrate, N.S. Gray, T. Shioda, M. Classon, S. Maheswaran, et al.
Genomic alterations of anaplastic lymphoma kinase may sensitize tumors to anaplastic lymphoma kinase inhibitors.
Cancer Res, 68 (2008), pp. 3389-3395
[16]
J.G. Christensen, H.Y. Zou, M.E. Arango, Q. Li, J.H. Lee, S.R. McDonnell, et al.
Cytoreductive antitumor activity of PF-2341066, a novel inhibitor of anaplastic lymphoma kinase and c-Met, in experimental models of anaplastic large-cell lymphoma.
Mol Cancer Ther, 6 (2007), pp. 3314-3322
[17]
Y. Koh, D.W. Kim, T.M. Kim, S.H. Lee, Y.K. Jeon, D.H. Chung, et al.
Clinicopathologic characteristics and outcomes of patients with anaplastic lymphoma kinase-positive advanced pulmonary adenocarcinoma. Suggestion for an effective screening strategy for these tumors.
J Thorac Oncol, 6 (2011), pp. 905-912
Copyright © 2011. Sociedade Portuguesa de Pneumologia
Download PDF
Pulmonology
Article options
Tools

Are you a health professional able to prescribe or dispense drugs?