Journal Information
Vol. 17. Issue 6.
Pages 260-265 (November - December 2011)
Visits
15251
Vol. 17. Issue 6.
Pages 260-265 (November - December 2011)
Artigo original
Open Access
Índices geométricos de variabilidade da frequência cardíaca na doença pulmonar obstrutiva crônica
Geometric index of heart rate variability in chronic obstructive pulmonary disease
Visits
15251
T. Dias de Carvalhoa,b,
Corresponding author
carvalho.td1@gmail.com

Autor correspondência.
, C. Marcelo Pastrea, R. Claudino Rossia, L.C. de Abreuc, V.E. Valentib,c, L.C. Marques Vanderleia
a Departamento de Fisioterapia, Universidade Estadual Paulista (UNESP), Presidente Prudente, SP, Brasil
b Departamento de Medicina, Disciplina de Cardiologia, Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), São Paulo, SP, Brasil
c Departamento de Morfologia e Fisiologia, Faculdade de Medicina do ABC, Santo André, SP, Brasil
This item has received

Under a Creative Commons license
Article information
Abstract
Full Text
Bibliography
Download PDF
Statistics
Figures (1)
Tables (2)
Tabela 1. Características antropométricas e espirométricas dos grupos DPOC e Controle.
Tabela 2. Valores médios, desvio-padrão, intervalo de confiança a 95% e valor de p para análise do índice triangular, TINN e plot de Poincaré dos grupos DPOC e controle.
Show moreShow less
Resumo
Introdução

A redução da variabilidade da frequência cardíaca (VFC) em pacientes com doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) em repouso já foi evidenciada na literatura.

Objetivo

Com intuito de inserir elementos na literatura sobre essa temática, foram avaliados índices geométricos de VFC de indivíduos com DPOC.

Método

Foram analisados dados de 34 voluntários, divididos em dois grupos, de acordo com os valores espirométricos, com 17 voluntários cada: DPOC (VEF1/CVF=47,3±10,2; VEF1=50,8±15,7) e controle (VEF1/CVF=78,8±10,8; VEF1=100,1±14,7). Para análise dos índices de VFC, a frequência cardíaca foi captada batimento a batimento com os voluntários em decúbito dorsal por 30 minutos. Foram analisados os índices seguintes: índice triangular (RRtri), interpolação triangular dos intervalos RR (TINN) e plot de Poincaré (SD1, SD2 e relação SD1/SD2). Foi realizada também análise visual da figura formada no plot de Poincaré. Teste t de Student para dados não pareados e teste de Mann-Whitney com nível de significância de 5% foram utilizados para análise dos dados.

Resultados

Foram observadas reduções estatisticamente significantes dos índices geométricos: RRtri (0,043 vs. 0,059, p=0,018), TINN (105,88 vs. 151,47, p=0,014), SD1 (9,76 vs. 14,55, p=0,014) e SD2 (34,86 vs. 51,51, p=0,010) no grupo DPOC. A relação SD1/SD2 (0,30±0,11 vs. 0,28±0,07; p=0,605) não apresentou diferença significante entre os grupos. Os voluntários com DPOC apresentaram na análise visual do plot de Poincaré menor dispersão dos intervalos RR, tanto batimento a batimento como em longo prazo.

Conclusão

Indivíduos com DPOC apresentaram diminuição dos índices geométricos da VFC, indicando que apresentam redução da variabilidade da frequência cardíaca.

Palavras-chave:
doença pulmonar obstrutiva crônica
frequência cardíaca
sistema nervoso autônomo
variabilidade da frequência cardíaca
Abstract
Background

It was already evidenced decreased heart rate variability (HRV) in chronic obstructive pulmonary disease (COPD) patients at rest.

Objective

In order to insert new elements in the literature regarding this issue, we evaluated geometric index of HRV in COPD subjects.

Method

We analyzed data from 34 volunteers, divided into two groups according to spirometric values: COPD (17 volunteers, FEV1/FVC=47.3±10.2; FEV1=50.8±15.7) and control (17 volunteers, FEV1/FVC=78.8±10.8; FEV1=100.1±14.7). For analysis of HRV indexes the volunteers remained in the supine position for 30minutes. We analyzed the following indexes: triangular index (RRtri), triangular interpolation of RR intervals (TINN) and Poincaré plot (SD1, SD2 and SD1/SD2). Student t test for unpaired samples and Mann-Whitney test were used for data analysis.

Results

We observed statistically significant reductions in geometric indexes in the COPD group: RRtri (0.043±0.01 vs. 0.059±0.02; p=0.018), TINN (105.88±51.82 vs. 151.47±49.9; p=0.014), SD1 (9.76±4.66 vs. 14.55±6.04; p=0.014) and SD2 (34.86±17.02 vs. 51.51±18.38; p=0.010). SD1/SD2 (0.30±0.11 vs. 0.28±0.07; p=0.605) were not significantly different between groups. Patients with COPD presented a visual analysis of Poincaré plot of lower dispersion of RR intervals both beat to beat and the long term.

Conclusion

Subjects with COPD present reduction of geometric indexes of HRV, indicating reduced heart rate variability.

Keywords:
chronic obstructive pulmonary disease
heart rate
autonomic nervous system
heart rate variability
Full Text
Introdução

A doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) é definida como estado de doença passível de prevenção e tratamento, caracterizado por obstrução crônica ao fluxo aéreo, a qual não é totalmente reversível1,2 e por significantes manifestações sistêmicas, como: depleção nutricional, alterações estruturais e funcionais dos músculos respiratórios e esqueléticos periféricos e arritmias3. Modificações da função do sistema nervoso autônomo (SNA) também são observadas em indivíduos com DPOC4,5. Isso é um fator negativo, visto que o SNC regula as funções internas do organismo e, portanto, merece atenção.

Uma das formas de avaliar o comportamento autonómico é a variabilidade da frequência cardíaca (VFC), termo convencionalmente aceite para descrever as oscilações nos intervalos entre batimentos cardíacos consecutivos (intervalos RR), que estão relacionadas às influências do SNA sobre o nódulo sinusal6. Dentre os métodos utilizados para análise da VFC encontram-se os métodos geométricos – índice triangular (RRtri), interpolação triangular dos intervalos RR (TINN) e plot de Poincaré – os quais permitem apresentar os intervalos RR em padrões geométricos e usar aproximações para derivar as medidas de VFC7.

O índice triangular e o TINN são calculados a partir da construção de um histograma de densidade dos intervalos RR normais que contém no eixo x o comprimento dos intervalos RR e no eixo y a frequência com que eles ocorreram. A união dos pontos das colunas do histograma forma uma figura semelhante a um triângulo, do qual são extraídos esses índices6,8. O plot de Poincaré é uma representação gráfica bidimensional da correlação entre intervalos RR consecutivos, em que cada intervalo é plotado contra o próximo intervalo7,9,10. Sua análise pode ser feita de forma qualitativa, por meio da avaliação da figura formada pelo seu atrator, a qual mostra o grau de complexidade dos intervalos RR11,12, ou quantitativa, pelo ajuste da elipse da figura formada pelo atrator, de onde se obtém os índices: SD1, SD2 e a razão SD1/SD213,14. A análise do plot de Poincaré é considerada por alguns autores como baseada na dinâmica não linear7,15.

Estudos da VFC em pacientes com DPOC têm demonstrado que estes apresentam diminuição dos índices de VFC em condições de repouso, quando comparados a sujeitos controlos da mesma faixa etária16–18. Reduções de índices que refletem tanto a modulação parassimpática isoladamente18 quanto a modulação simpática e parassimpática, em conjunto5, estão descritas na literatura. Esses trabalhos versando sobre alterações da função autonômica na DPOC avaliaram os índices utilizando métodos lineares nos domínios do tempo e da frequência. Entretanto, para melhorar o nosso conhecimento, são escassos os trabalhos que avaliam a VFC em pacientes com DPOC por meio de índices geométricos. Após busca na literatura técnica pertinente, apenas um estudo foi encontrado, utilizando o índice geométrico TINN19. Nesse trabalho foram observados menores valores desse índice para sujeitos com DPOC, em comparação a indivíduos saudáveis.

Com intuito de acrescentar elementos à literatura acerca dessa temática, o objetivo é investigar índices geométricos de VFC de indivíduos com DPOC.

MétodoPopulação de estudo

Para conduzir este estudo, foram recrutados todos os pacientes disponíveis no Centro de Estudos e Atendimento em Fisioterapia e Reabilitação da Faculdade de Ciências e Tecnologia – FCT/UNESP (Presidente Prudente, Brasil). Para compor o grupo DPOC, todos os indivíduos tinham o diagnóstico clínico de DPOC e atendiam aos seguintes critérios de inclusão: 1) diagnóstico clínico de DPOC confirmado pela espirometria, de acordo com Global Initiative for Chronic Obstructive Pulmonary Disease (GOLD)1, 2) não tabagistas, visto que a nicotina altera a modulação autonômica cardíaca20, 3) sem uso de medicação com influência sobre a modulação autonômica, 4) ausência de doenças metabólicas, 5) sem exacerbação do quadro de DPOC nos últimos dois meses. Quando alguma condição de doença foi relatada, o voluntário não foi incluído na amostra.

Assim, foram selecionados 17 pacientes (10 homens) com diagnóstico de DPOC, classificados como GOLD II e III, por meio dos valores espirométricos1. O grupo controle foi constituído por 17 voluntários (8 homens) aparentemente saudáveis, com valores normais na espirometria.

Todos os voluntários foram informados sobre os procedimentos e objetivos do estudo e, após concordarem, assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido. Todos os procedimentos do estudo foram aprovados pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Ciências e Tecnologia – FCT/UNESP, Campus de Presidente Prudente (processo n.° 246/08) e atenderam a Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde (10/10/1996).

Avaliação inicial

Antes do início do procedimento experimental, os voluntários foram identificados coletando-se as seguintes informações: idade, sexo, peso, altura e índice de massa corpórea (IMC). As medidas antropométricas foram obtidas de acordo com as recomendações descritas por Lohman et al21. O peso foi mensurado em uma balança digital (W 200/5, Welmy, Brasil) com precisão de 0,1kg e a altura por meio de um estadiômetro (ES 2020, Sanny, Brasil). O índice de massa corpórea (IMC) foi calculado usando a seguinte fórmula: peso (kg) / altura (m)2.

Protocolo experimental

Os dados foram coletados em uma sala com temperatura entre 21°C e 24° C e humidade entre 40 e 60% e os voluntários foram orientados a não ingerirem bebidas alcoólicas nem cafeína nas 24 horas anteriores à avaliação. A coleta de dados foi realizada de forma individual, entre as 8:00 e 11:00 da manhã para evitar a influência do ritmo circadiano. Todos os procedimentos necessários para a coleta de dados foram explicados aos voluntários, os quais foram orientados a manterem-se em repouso, evitando conversar durante a coleta.

Após a avaliação inicial, foi colocada no tórax dos voluntários, no terço distal do esterno, a cinta de captação e no punho, o receptor de frequência cardíaca Polar S810i (Polar Electro, Finlândia), equipamento previamente validado para captação da frequência cardíaca batimento a batimento e a utilização dos seus dados para análise da VFC22–24. Após a colocação da cinta e do monitor, os voluntários foram posicionados em decúbito dorsal e permaneceram em repouso respirando espontaneamente por 30 minutos.

Após esse procedimento, foi realizada a prova espirométrica para identificar e estratificar o grau de obstrução brônquica. Para sua realização foi utilizado o espirômetro Spirobank (MIR, Itália) versão 3.6 acoplado a um microcomputador, seguindo os critérios descritos pelas Diretrizes para Testes de Função Pulmonar25.

Análise dos índices de variabilidade da frequência cardíaca

A frequência cardíaca foi registrada batimento a batimento durante todo o protocolo experimental com uma taxa de amostragem de 1.000Hz. Para análise dos índices geométricos da VFC das séries de intervalos RR obtidas, foram selecionados trechos de 20 minutos no período de maior estabilidade do sinal6. Nesses trechos foi feita filtragem digital complementada por manual para eliminar batimentos ectópicos prematuros e artefatos, e somente séries com mais de 95% de batimentos sinusais foram incluídas no estudo25–28.

Foram analisados os seguintes índices geométricos: RRtri, TINN e plot de Poincaré (SD1, SD2, relação SD1/SD2).

O RRtri foi calculado a partir da construção do histograma de densidade dos intervalos RR normais, e foi obtido pela divisão da integral do histograma (isto é, o número total de intervalos RR) pelo máximo da distribuição de densidade (frequência modal dos intervalos RR), mensurado em uma escala discreta com caixas de 7.8125ms (1/128 segundos)6.

O TINN consiste na largura da linha de base da distribuição medida como a base de um triângulo, aproximando a distribuição de todos os intervalos RR, sendo que a diferença dos mínimos quadrados foi utilizada para determinação do triângulo6.

Para construção do plot de Poincaré cada intervalo RR foi representado em função do intervalo anterior e para análise quantitativa do plot de Poincaré foram calculados os seguintes índices: SD1 (desvio-padrão da variabilidade instantânea batimento a batimento), SD2 (desvio-padrão a longo prazo dos intervalos RR contínuos) e a relação SD1/SD213. A análise qualitativa (visual) do plot de Poincaré foi feita por meio da análise das figuras formadas pelo atrator do plot, as quais foram descritas a seguir29,30:

  • 1)

    Figura na qual um aumento na dispersão dos intervalos RR batimento a batimento é observado, com aumento nos intervalos RR, característica de um plot normal.

  • 2)

    Figura com pequena dispersão global batimento a batimento e sem aumento da dispersão dos intervalos RR a longo prazo.

O software HRV analysis – Versão 2.0 foi utilizado para determinação desses índices31.

Análise estatística

Para comparação dos grupos, inicialmente foi determinada a normalidade dos dados por meio do teste Shapiro-Wilk. Quando a distribuição normal foi aceite, o teste t de Student para dados não pareados (idade, SD1, SD2, SD1/SD2, RRtri, TINN) foi aplicado, e nas situações em que a distribuição normal não foi aceite foi aplicado o teste de Mann-Whitney (peso, altura, IMC, CVF, VEF1, FEV1/CVF e PEF). Diferenças nesses testes foram consideradas estatisticamente significativas quando o valor de «p»foi menor ou igual a 0,05.

Resultados

A tabela 1 apresenta as medidas antropométricas e espirométricas dos grupos DPOC e controle. Observaram-se valores de IMC, capacidade vital forçada (CVF), volume expiratório forçado no primeiro segundo (VEF1), relação entre volume expiratório forçado e capacidade vital forçada (VEF1/CVF) e pico de fluxo expiratório (PEF) significantemente menores para o grupo DPOC em comparação ao grupo controle.

Tabela 1.

Características antropométricas e espirométricas dos grupos DPOC e Controle.

Variáveis  DPOC  Controle  Valor p 
Idade (anos)  73,06±5,64  68,75±8,63  0,089 
Peso (Kg)  63,9±11,4  67,6±13,2  0,326 
Altura (m)  1,63±0,89  1,57±0,91  0,069 
IMC (Kg/m223,82±3,11  27,35±4,95  0,018a 
CVF (%)  80,8±20,6  98,1±15,0  0,019a 
VEF1 (%)  50,8±15,7  100,1±14,7  <0,0001a 
VEF1/CVF  47,3±10,2  78,8±10,8  < 0,0001a 
PEF (L/s)  3,5±1,6  6,2±2,2  0,0002a 
a

Diferença significativa entre os grupos; Abreviaturas: CVF: capacidade vital forçada; DPOC: doença pulmonar obstrutiva crônica; IMC: índice da massa corpórea; PEF: pico de fluxo expiratório; VEF1: volume expiratório forçado no primeiro segundo.

A tabela 2 apresenta os valores obtidos para o índice triangular, TINN, SD1, SD2 e relação SD1/SD2 dos portadores de DPOC e indivíduos controlo. Foram observados valores reduzidos dos índices TINN, SD1, SD2 e índice triangular no grupo DPOC. Entretanto a relação SD1/SD2 não apresentou diferença estatisticamente significativa.

Tabela 2.

Valores médios, desvio-padrão, intervalo de confiança a 95% e valor de p para análise do índice triangular, TINN e plot de Poincaré dos grupos DPOC e controle.

Variáveis  DPOC  Controlo  Valor p 
RRtri  0,043±0,018 [0,034-0,052]  0,059±0,020 [0,049-0,069]  0,018a 
TINN  105,88±51,82 [79,24-132,53]  151,47±49,90 [125,81-177,13]  0,014a 
SD1  9,76±4,66 [7,36-12,15]  14,55±6,04 [11,44-17,65]  0,014a 
SD2  34,86±17,02 [26,11-43,61]  51,51±18,38 [42,06-60,96]  0,010a 
Relação SD1/SD2  0,30±0,11 [0,24-0,36]  0,28±0,07 [0,25-0,32]  0,605 
a

Diferença significante entre os grupos; Abreviaturas: RRtri: índice triangular; SD1: desvio-padrão da variabilidade instantânea batimento a batimento; SD2: desvio-padrão em longo prazo dos intervalos RR contínuos; TINN: interpolação triangular dos intervalos RR.

A figura 1 mostra um exemplo padrão do plot de Poincaré para um voluntário controle (A) e um portador de DPOC (B). Ela sugere atividade parassimpática reduzida em sujeitos com DPOC.

Figura 1.

Padrão visual do plot de Poincaré observado no grupo controle (voluntário A – SD1=15,5 e SD2=47,6) e no grupo DPOC (voluntário B – SD1=8,0 e SD2=30,3).

(0.1MB).
Discussão

No presente estudo, foram avaliados índices geométricos de VFC de indivíduos com DPOC. Os resultados mostram que o SD1 está reduzido no grupo DPOC, assim como SD2, TINN e RRtri. A razão SD1/SD2, contudo, foi semelhante entre os grupos. Esses achados sugerem VFC reduzida em portadores de DPOC.

Observa-se que o índice SD1 é menor nos voluntários com DPOC em comparação aos voluntários sem a doença, o que sugere redução na atividade parassimpática nesses indivíduos. Tal índice que representa o eixo transverso do plot de Poincaré mostra o desvio-padrão da variabilidade instantânea da frequência cardíaca batimento a batimento13,32 e indica a influência parassimpática sobre o nódulo sinoatrial30,33. Redução da modulação vagal em indivíduos com DPOC, avaliada por índices tanto no domínio do tempo quanto no da frequência, também foi verificada por Pantoni et al5, os quais observaram redução dos índices square root of the mean squared differences of successive NN intervals (–RMSSD, ‘raiz quadrada da média das diferenças entre intervalos RR sucessivos’) e high frequency (– HF, ‘alta frequência’) nesses indivíduos.

Índices característicos da modulação autonômica global (SD2, RRtri e TINN) também se apresentaram reduzidos neste trabalho, corroborando os achados de diversos estudos que apontam para um prejuízo autonômico geral na DPOC19,34,35. Também em repouso supino, Volterrani et al23 e Paschoal et al16 encontraram redução da modulação autonômica global em portadores de DPOC em comparação ao grupo controle por meio do índice standard deviation of normal to normal (– SDNN, ‘desvio-padrão dos intervalos RR normais’)obtido no domínio do tempo, confirmando resultados na mesma condição de repouso, porém utilizando o índice low frequency (–LF, ‘baixa frequência’)17,36.

Nota-se que o TINN também foi significantemente menor no grupo DPOC em comparação ao grupo controle. Esses achados estão de acordo com o trabalho de Sin et al19, os quais verificaram que o referido índice de portadores de DPOC esteve menor do que o de voluntários saudáveis (322 vs. 444ms). Ressalta-se ainda que o valor médio do TINN obtido neste trabalho é inferior aos encontrados por esses autores19, o que pode estar relacionado à maior média de idade da população deste estudo, em relação à média de idade do grupo estudado por Sin et al19.

Quanto à relação SD1/SD2, as análises mostram que não ocorrem diferenças significativas dessa relação entre os grupos, o que pode ser justificado pela redução observada tanto no índice SD1 quanto no SD2 nos voluntários com DPOC.

A análise visual (qualitativa) do plot de Poincaré permitiu também observar a redução da VFC em indivíduos com DPOC. Nesses indivíduos observa-se menor dispersão dos intervalos RR tanto batimento a batimento como em longo prazo, formando uma imagem característica de redução de VFC. Nos indivíduos controlos os intervalos entre os batimentos cardíacos são irregulares, fazendo com que se visualize, na plotagem de Poincaré, uma nuvem de pontos. Ainda não está bem estabelecido o mecanismo pelo qual a modulação autonômica está alterada na DPOC. Hipóteses são consideradas em relação ao tônus predominante nesses casos pois a hiperinsuflação característica do quadro poderia gerar impulsos vagais alterados17. Adicionalmente, pacientes hipoxêmicos poderiam sofrer de função autonômica anormal34 e a suplementação de oxigênio poderia reverter parcialmente essa disfunção4.

Está claro na literatura que a redução da VFC pode ser um indicativo de pior prognóstico em doenças cardiovasculares27 e estar relacionada ao aparecimento de arritmias37 e morte súbita38. Além disso, cardiopatias frequentemente coexistem com a doença pulmonar, influenciando na morbidade e mortalidade desses pacientes2,4,5. Da mesma maneira, são descritos na literatura os efeitos benéficos do exercício físico sobre a modulação autonômica cardíaca13,14,16. Assim, destaca-se a relevância dos programas de reabilitação pulmonar no tratamento da DPOC, sobretudo a prática supervisionada de atividade física.

Ressaltam-se limitações no presente estudo e, nesse sentido, as características antropométricas dos voluntários devem ser discutidas. Não foi possível manter o mesmo IMC entre o grupo DPOC e o grupo controle. Por se tratar de uma doença sistêmica, o aumento dos mediadores inflamatórios pode contribuir para a elevação do metabolismo e do desequilíbrio entre ingestão alimentar e gasto energético, levando à perda de peso observada nesses indivíduos1,3, refletida pelo menor IMC desse grupo. Embora seja reconhecido que a obesidade altera a modulação autonômica cardíaca30,39, seus efeitos sobre a VFC de pacientes com DPOC não são conhecidos. Estudos posteriores com esse objetivo são necessários entre DPOC e controles.

Outra limitação deste trabalho foi a ausência de testes clínicos específicos para avaliar a condição cardíaca dos voluntários. Entretanto, todos os sujeitos eram avaliados por médicos e entendeu-se que, se houvesse quaisquer cardiopatias, elas seriam relatadas pelos participantes. Como mencionado anteriormente, se alguma morbidade fosse relatada, o voluntário não seria incluído no estudo.

Em resumo, a análise por meio de índices geométricos sugere que indivíduos com DPOC apresentam disfunções autonômicas, caracterizadas por reduções na variabilidade da frequência cardíaca. Os resultados indicam que esses índices, obtidos por uma técnica não invasiva e de baixo custo, podem ser úteis tanto para avaliação clínica das manifestações sistêmicas da doença, quanto para a estratificação de risco e o acompanhamento de condutas terapêuticas realizadas com esses pacientes.

Conclui-se que os índices geométricos de variabilidade da frequência cardíaca de portadores de DPOC mostraram-se reduzidos em relação aos sujeitos controles, indicando que esses indivíduos apresentam redução da VFC.

Financiamento

Esta pesquisa recebeu suporte financeiro da FUNDUNESP (Processo n.° 00704/08 – DFP).

Conflito de interesses

Os autores declaram não haver conflito de interesses.

Bibliografia
[1]
K.F. Rabe, S. Hurd, A. Anzueto, P.J. Barnes, S.A. Buist, P. Calverley, et al.
Global Initiative for Chronic Obstructive Lung Disease. Global Initiative for Chronic Obstructive Lung Disease: GOLD executive summary.
Am J Respir Crit Care Med, 176 (2007), pp. 532-555
[2]
T.A. Seemungal, J.R. Hurst, J.A. Wedzicha.
Exacerbation rate, health status and mortality in COPD--a review of potential interventions.
Int J Chron Obstruct Pulmon Dis, 4 (2009), pp. 203-223
[3]
V.Z. Dourado, S.E. Tanni, S.A. Vale, I. Godoy.
Factors associated with the minimal clinically important difference for health-related quality of life after physical conditioning in patients with COPD.
J Bras Pneumol, 32 (2006), pp. 161-171
[4]
A. Borghi-Silva, R. Arena, V. Castello, R.P. Simões, L.E. Martins, A.M. Catai, et al.
Aerobic exercise training improves autonomic nervous control in patients with COPD.
Respir Med, 103 (2009), pp. 1503-1510
[5]
C.B.F. Pantoni, M.S. Reis, L.E.B. Martins.
Estudo da modulação autonômica da freqüência cardíaca em repouso de pacientes idosos com doença pulmonar obstrutiva crônica.
Rev Bras Fisioter, 11 (2007), pp. 35-41
[6]
Task Force of the European Society of Cardiology and the North American Society of Pacing and Electrophysiology.
Heart rate variability: standards of measurement, physiological interpretation and clinical use.
Circulation, 93 (1996), pp. 1043-1065
[7]
A.S. Khaled, M.I. Owis, A.S.A. Mohamed.
Employing time-domain methods and poincaré plot of heart rate variability signals to detect congestive heart failure.
BIME Journal, 6 (2006), pp. 35-41
[8]
U. Rajendra Acharya, K. Paul Joseph, N. Kannathal, C.M. Lim, J.S. Suri.
Heart rate variability: a review.
Med Bio Eng Comput, 44 (2006), pp. 1031-1051
[9]
A.L. Smith, K.J. Reynolds, H. Owen.
Correlated Poincaré indices for measuring heart rate variability.
Australas Phys Eng Sci Med, 30 (2007), pp. 336-341
[10]
C. Lerma, O. Infante, H. Pérez-Grovas, M.V. José.
Poincaré plot indexes of heart rate variability capture dynamic adaptations after haemodialysis in chronic renal failure patients.
Clin Physiol Funct Imaging, 23 (2003), pp. 72-80
[11]
G. De Vito, S.D. Galloway, M.A. Nimmo, P. Maas, J.J. McMurray.
Effects of central sympathetic inhibition on heart rate variability during steady-state exercise in healthy humans.
Clin Physiol & Func Im, 22 (2002), pp. 32-38
[12]
M.A. Woo, W.G. Stevenson, D.K. Moser, R.B. Trelease, R.M. Harper.
Patterns of beat to beat heart rate variability in advanced heart failure.
Am Heart J, 123 (1992), pp. 704-710
[13]
J.C. Lam, C.S. Yan, A.Y. Lai, S. Tam, D.Y. Fong, B. Lam, et al.
Determinants of daytime blood pressure in relation to obstructive sleep apnea in men.
[14]
M.P. Tulppo, T.H. Mäkikallio, T. Seppänen, R.T. Laukkanen, H.V. Huikuri.
Vagal modulation of heart rate during exercise: effects of age and physical fitness.
Am J Physiol, 274 (1998), pp. H424-H429
[15]
A. Voss, R. Schroeder, S. Truebner, M. Goernig, H.R. Figulla, A. Schirdewan.
Comparison of nonlinear methods symbolic dynamics, detrended fluctuation, and Poincaré plot analysis in risk stratification in patients with dilated cardiomyopathy.
Chaos, 17 (2007), pp. 15120-15130
[16]
M.A. Paschoal, K.F.S. Petrelluzzi, N.V.O. Gonçalves.
Estudo da variabilidade da frequência cardíaca em pacientes com doença pulmonar obstrutiva crônica.
Rev Ciênc Med, 11 (2002), pp. 27-37
[17]
M. Pagani, D. Lucini, P. Pizzinelli, M. Sergi, E. Bosisio, G.S. Mela, et al.
Effects of aging and of chronic obstructive pulmonary disease on RR interval variability.
J Auton Nerv Syst, 59 (1996), pp. 125-132
[18]
M. Volterrani, S. Scalvini, G. Mazzuero, P. Lanfranchi, R. Colombo, A.L. Clark, et al.
Decreased heart rate variability in patients with chronic obstructive pulmonary disease.
Chest, 106 (1994), pp. 1432-1437
[19]
D.D. Sin, E. Wong, I. Mayers, D.C. Lien, D. Feeny, H. Cheung, et al.
Effects of nocturnal noninvasive mechanica ventilation on heart rate variability of patients with advanced COPD.
Chest, 131 (2007), pp. 156-163
[20]
S.T. Hanna.
Nicotine effect on cardiovascular system and ion channels.
J Cardiovasc Pharmacol, 47 (2006), pp. 348-358
[21]
Lohman TG, Roche AF, Martorell R. (eds.). Anthropometric standardization reference manual. Champaign, Illinois, USA: Human Kinetics Books; 1988.
[22]
L.G.G. Porto, L.F. Junqueira Júnior.
Comparison of time-domain short-term heart interval variability analysis using a wrist-worn heart rate monitor and the conventional electrocardiogram.
[23]
L.C. Vanderlei, C.M. Pastre, R.A. Hoshi, T.D. Carvalho, M.F. Godoy.
Basic notions of heart rate variability and its clinical applicability.
Rev Bras Cir Cardiovasc, 24 (2009), pp. 205-217
[24]
F.X. Gamelin, S. Berthoin, L. Bosquet.
Validity of the Polar S810 Heart Rate Monitor to Measure R-R Intervals at Rest.
Med Sci Sports Exerc, 38 (2006), pp. 887-893
[25]
C.A.C. Pereira, J.A. Neder.
Diretrizes para testes de função pulmonar.
J Pneumol, 28 (2002), pp. S1-S238
[26]
M.A. Paschoal, P.F. Trevizan, N.F. Scodeler.
Heart rate variability, blood lipids and physical capacity of obese and non-obese children.
Arq Bras Cardiol, 93 (2009), pp. 239-246
[27]
Y. Gunes, U. Guntekin, M. Tuncer, M. Sahin.
The effects of trimetazidine on heart rate variability in patients with heart failure.
Arq Bras Cardiol, 93 (2009), pp. 154-158
[28]
A.B. Kulur, N. Haleagrahara, P. Adhikary, P.S. Jeganathan.
Effect of diaphragmatic breathing on heart rate variability in ischemic heart disease with diabetes.
Arq Bras Cardiol, 92 (2009), pp. 423-429
[29]
M. Tuncer, Y. Gunes, U. Guntekin, H.A. Gumrukcuoglu, B. Eryonucu, N. Guler, et al.
Heart rate variability in patients with iron deficiency anemia.
Arq Bras Cardiol, 92 (2009), pp. 368-371
[30]
L.C. Vanderlei, C.M. Pastre, I.F. Freitas Jr., M.F. Godoy.
Geometric indexes of heart rate variability in obese and eutrophic children.
Arq Bras Cardiol, 95 (2010), pp. 35-40
[31]
M.P. Tulppo, T.H. Mäkikallio, T.E. Takala, T. Seppänen, H.V. Huikuri.
Quantitative beat-to-beat analysis of heart rate dynamics during exercise.
Am J Physiol Heart Circ Physiol, 271 (1996), pp. H244-H252
[32]
J.P. Niskanen, M.P. Tarvainen, P.O. Ranta-Aho, P.A. Karjalainen.
Software for advanced HRV analysis.
Comput Methods Programs Biomed, 76 (2004), pp. 73-81
[33]
D.V. James, L.J. Reynolds, S. Maldonado-Martin.
Influence of the duration of a treadmill walking bout on heart rate variability at rest in physically active women.
J Phys Act Health, 7 (2010), pp. 95-101
[34]
V.A. Bricout, S. Dechenaud, A. Favre-Juvin.
Analyses of heart rate variability in young soccer players: the effects of sport activity.
Auton Neurosci, 154 (2010), pp. 112-116
[35]
W.L. Chen, G.Y. Chen, C.D. Kuo.
Hypoxemia and autonomic nervous dysfunction in patients with chronic obstructive pulmonary disease.
Respir Med, 100 (2006), pp. 1547-1553
[36]
T.D. Carvalho, C.M. Pastre, M.F. Godoy, F.O. Pitta, C. Ferreira, L.C. Abreu, et al.
Fractal correlation property of heart rate variability in chronic obstructive pulmonary disease.
Int J Chron Obstruct Pulm Dis, 6 (2011), pp. 1-6
[37]
P.K. Stein, P. Nelson, J.N. Rottman, D. Howard, S.M. Ward, R.E. Kleiger, et al.
Heart rate variability reflects severity of COPD in PiZ alpha1-antitrypsin deficiency.
Chest, 1 (1998), pp. 327-333
[38]
T. Tükek, P. Yildiz, D. Atilgan, V. Tuzcu, M. Eren, O. Erk, et al.
Effect of diurnal variability of heart rate on development of arrhythmia in patients with chronic obstructive pulmonary disease.
Int J Cardiol, 88 (2003), pp. 199-206
[39]
I. Tonhajzerova, M. Javorka, Z. Trunkvalterova, O. Chroma, J. Javorkova, Z. Lazarova, et al.
Cardio-respiratory interaction and autonomic dysfunction in obesity.
J Physiol Pharmac, 59 (2008), pp. 709-718
Copyright © 2010. Sociedade Portuguesa de Pneumologia
Download PDF
Pulmonology
Article options
Tools

Are you a health professional able to prescribe or dispense drugs?